O Regulamento (UE) n.º 909/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014, relativo à melhoria da liquidação de valores mobiliários na União Europeia e às Centrais de Valores Mobiliários (Regulamento das CSDs) é uma peça chave que integra o extenso mapa regulatório europeu, com o objetivo de melhorar e promover a segurança, eficiência e competitividade dos mercados financeiros da União Europeia (UE).

O Regulamento das CSDs tem como objetivo primordial harmonizar a liquidação de instrumentos financeiros na Europa e fornecer um conjunto de requisitos comuns, em matéria de organização e conduta, para as CSDs que operam sistemas de liquidação de valores mobiliários (SSS – Securities Settlement Systems), criando pela primeira vez, a nível europeu, um quadro regulamentar, comum, para as CSDs.

O Nível 1 do Regulamento das CSDs corresponde ao regulamento principal e respetivos anexos, publicados no Jornal Oficial da UE, em 28 de agosto de 2014, com entrada em vigor a 17 de setembro de 2014, e encontra-se dividido em três partes principais:

Liquidação de Valores Mobiliários


Centrais de Valores Mobiliários


Prestação de serviços bancários auxiliares aos participantes das CSDs

Ao Nível 2 do Regulamento das CSDs correspondem normas técnicas de regulamentação (Regulatory Technical Standards – RTS) e normas técnicas de execução (Implementing Technical Standards – ITS) elaboradas pela Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e Mercados (ESMA) e pela Autoridade Bancária Europeia (EBA).

Os sistemas de liquidação de valores mobiliários geridos pelas CSDs têm uma posição chave no processo de liquidação assim como no correto funcionamento dos mercados de valores mobiliários.

Os crescentes acordos de interligação entre CSDs têm ditado um aumento significativo de liquidações transfronteiriças; a adoção, na Europa, de um conjunto de medidas harmonizadas para a liquidação e para as instituições por ela responsável, tem-se mostrado de necessidade vital como forma de reduzir a distinção entre transações de valores mobiliários a nível nacional e internacional.

A criação de um regulamento único, que minimize a complexidade regulamentar que os intervenientes no mercado e as CSDs enfrentam, devido à existência de regras nacionais diferentes, permitirá o reforço da eficiência e da segurança da liquidação na UE mediante a adoção de obrigações, recomendações, requisitos e regras idênticas, diretamente aplicáveis.

O Regulamento das CSDs prossegue os objetivos de outros regulamentos da União Europeia para os mercados financeiros, e coloca uma tónica particular na harmonização, eficiência e segurança dos mercados de capitais com o objetivo de os manter seguros e competitivos a nível mundial.

  • Objetivos essenciais

Promover e ampliar a segurança e a eficiência da liquidação de valores mobiliários, com particular destaque para as liquidações transfronteiriças, mediante o estabelecimento de obrigações uniformes aos vários intervenientes do mercado no que se refere ao ciclo e disciplina da liquidação

Estabelecer um conjunto de requisitos uniformes aplicáveis às CSDs que gerem sistemas de liquidação de valores mobiliários, em matéria de organização e conduta


O Regulamento das CSDs aplica-se a todas as CSDs da UE e introduz também medidas que têm impacto direto nos Participantes (clientes das CSDs).

  • Nova definição de CSD

As CSDs são estruturas de enorme relevância sistémica, que protegem os mercados financeiros e asseguram a integridade das emissões de valores mobiliários sendo fundamental a garantia da sua segurança e fiabilidade enquanto instituições responsáveis pela gestão de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários e pelo registo inicial de valores mobiliários.

A definição de CSD passa a ser definida de forma funcional, por referência a determinados serviços principais.

A fim de ser qualificada como CSD a entidade em causa deverá prestar, pelo menos, dois serviços principais, sendo que um deles deverá ser o serviço de liquidação.

Serviços principais das CSDs (core services):

Anexo ao Regulamento das CSDs – Secção A

Serviço de registo em conta:
Registo inicial de valores mobiliários num sistema de registo centralizado

Serviço de administração de sistema de registo centralizado:
Estruturação e administração de sistema centralizado de valores mobiliários

Serviço de liquidação:
Gestão de sistemas de liquidação de valores mobiliários

Serviços auxiliares das CSDs de tipo não bancário:
Anexo ao Regulamento das CSDs – Secção B

Serviços relacionados com o serviço de liquidação:
Ex: empréstimo de valores mobiliários, gestão de colateral

Serviços relacionados com os serviços de registo em conta e de administração de sistema de registo centralizado.
Ex: apoio ao tratamento de eventos, atribuição de códigos ISIN e similares

Estabelecimento de links entre CSDs e outros serviços auxiliares:
Ex: manutenção e gestão de contas relacionadas com o serviço de liquidação

  • Requisitos aplicáveis às CSDs

Às CSDs são aplicadas regras uniformes que garantam a sua segurança e fiabilidade enquanto instituições responsáveis pela gestão de sistemas de liquidação de valores mobiliários:

  • Regras de governação societária;
  • Manutenção e guarda de registos relativos aos serviços e atividades por si prestados (record keeping);
  • Regras e procedimentos adequados para assegurar a integridade das emissões de valores mobiliários e reduzir o risco associado à sua guarda e liquidação – medidas de reconciliação;
  • Proteção dos valores mobiliários e dos participantes – segregação de contas;
  • Subcontratação de serviços e/ou atividades;
  • Transparência no que se refere aos serviços por si prestados;
  • Requisitos de participação no sistema de liquidação de valores mobiliários por si gerido;
  • Requisitos prudenciais e de capital;
  • Regras aplicáveis às ligações entre CSDs.
  • Autorização, supervisão e Passaporte das CSDs

As CSDs estão sujeitas a autorização e supervisão por parte das respetivas autoridades competentes.


As CSDs autorizadas num Estado-Membro serão reconhecidas em todo o espaço da UE para prestação direta de serviços ou através de uma sucursal, noutro Estado-Membro.

Para além de regular as atividades das CSDs, o Regulamento das CSDs inclui também uma série de medidas que têm como objetivo harmonizar certas práticas na UE relacionadas com imobilização / desmaterialização de títulos e disciplina da liquidação, para que o processo da liquidação assim como a guarda de valores mobiliários se torne mais seguro e eficiente.

Os Participantes dos sistemas de liquidação são objeto de impactos diretos (resultantes das medidas de harmonização impostas) e de impactos indiretos (através das exigências impostas às CSDs, pela regulamentação em vigor).

Desmaterialização e imobilização obrigatórias
Artigo 3.º do Regulamento das CSDs

Liquidação internalizada
Artigo 9.º do Regulamento das CSDs + Regulamento Delegado (UE) 2017/391 e Regulamento de Execução (UE) 2017/393

Integridade da emissão
Artigo 37.º do Regulamento das CSDs

Disciplina da Liquidação
Artigos 6.º a 8.º do Regulamento das CSDs

Proteção dos valores mobiliários dos participantes e dos seus clientes (Segregação de contas)
Artigo 38.º do Regulamento das CSDs

Uso obrigatório do Código LEI (Legal Entity Identifier)
Regulamento de Execução (UE) 2017/394

Artigo 3.º do Regulamento das CSDs

As transações de valores mobiliários através de uma plataforma de negociação pressupõem o seu registo prévio sob a forma escritural, mediante a sua imobilização ou mediante emissão direta sob a forma desmaterializada, num sistema centralizado gerido por uma CSD.

A obrigatoriedade do registo escritural de valores mobiliários (através da desmaterialização ou imobilização) aumenta a eficiência da liquidação e reduz os custos. Ao mesmo, tempo garante a integridade das emissões de valores mobiliários, promovendo:

Segurança para os detentores, na medida em que minimiza o risco e a possibilidade de fraude;

Segurança para as EEs dado que possibilita a reconciliação entre os valores emitidos e a quantidade que se encontra em circulação.

A legislação Portuguesa está, quanto a este requisito, em conformidade com o Regulamento das CSDs (cfr. Código dos Valores Mobiliários).

Artigos 6.º a 8.º do Regulamento das CSDs

A disciplina da liquidação é um dos novos e fundamentais regimes do Regulamento das CSDs cujo objetivo é promover a eficiência operacional das CSDs e assim contribuir para a liquidação atempada na UE.

O referido regime introduz uma série de regras destinadas a incentivar a liquidação de transações, na data de liquidação prevista e requer às CSDs a adoção de medidas para prevenir e tratar falhas de liquidação através da introdução de sanções pecuniárias obrigatórias (cash penalties) em dinheiro e mecanismos de recompra (buy-in) / compensação.

Artigo 9.º do Regulamento das CSDs
Regulamento Delegado (UE) 2017/391 da Comissão
Regulamento de Execução (UE) 2017/393 da Comissão

A fim de fornecer dados fiáveis sobre a dimensão da liquidação de valores mobiliários fora de sistemas de liquidação e de assegurar que os riscos supervenientes possam ser controlados e tratados, todas as instituições que não sejam CSDs e que procedam à liquidação de transações de valores mobiliários fora de um sistema de liquidação de valores mobiliários deverão reportar as suas atividades de liquidação às autoridades competentes em causa.

As autoridades competentes destinatárias deverão transmitir seguidamente essas informações à ESMA e informá-la de quaisquer riscos potenciais resultantes de tais atividades de liquidação.



A ESMA deverá controlar essas atividades de liquidação e ter em conta os riscos potenciais que daí possam advir.

Artigo 37.º do Regulamento das CSDs

As CSDs têm implementadas medidas de reconciliação diárias as quais visam verificar a integridade das emissões.

Os Participantes terão de conciliar os seus registos com as informações recebidas das CSDs numa base diária e terão de fornecer à CSD, sempre que se revele necessário, todas as informações consideradas indispensáveis para garantir a integridade das emissões e para resolver eventuais problemas de reconciliação.

Artigo 38.º do Regulamento das CSDs

As CSDs devem manter registos e contas que permitam:

Segregar nas contas da CSD os valores mobiliários de um Participante dos de qualquer outro Participante e, se aplicável, dos próprios ativos da CSD.

Que os Participantes segreguem os seus valores mobiliários dos valores mobiliários dos seus clientes.

Que os Participantes detenham numa mesma conta valores mobiliários pertencentes a diferentes clientes (“segregação total de clientes”).

Que os Participantes segreguem os valores mobiliários dos seus clientes, se e quando tal lhes for solicitado pelos Participantes (“segregação de cliente individual”).

Por outro lado, os Participantes têm de dar, também, aos seus clientes, pelo menos, a possibilidade de optarem entre a segregação total de clientes e a segregação de cliente individual, e informá-los dos custos e dos riscos associados a cada opção.

Regulamento de Execução (UE) 2017/394

Os Intermediários Financeiros e as Entidades Emitentes têm que fornecer às CSDs informação sobre os códigos LEI para que os mesmos sejam guardados pela CSD e reportados à autoridade nacional competente – Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), quando solicitado.

Os objetivos do Regulamento das CSDs são consistentes e complementares com os da plataforma T2S – TARGET2- Securities uma vez que se destinam a harmonizar os aspetos jurídicos da liquidação de valores mobiliários e as regras para as CSDs a nível da UE, permitindo ao T2S (que visa a harmonização dos aspetos operacionais da liquidação de valores mobiliários) atingir os seus objetivos de forma mais eficaz.

O principal impacto do Regulamento das CSDs no T2S – TARGET2-Securities relaciona-se com as seguintes matérias:

Manutenção e guarda de registos relativos aos serviços e atividades por si prestados (Record keeping);

Disciplina de liquidação – mecanismo de penalização e procedimento de recompra.

O Regulamento das CSDs é complementar à demais regulamentação dos mercados financeiros da UE, designadamente:

  • Diretiva 2014/65/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativa aos mercados de instrumentos financeiros;
  • O Regulamento (UE) n.º 648/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de julho de 2012, relativo aos derivados do mercado de balcão, às contrapartes centrais e aos repositórios de transações, vulgarmente designado por EMIR (da designação em língua inglesa European Market Infrastructure Regulation).

O regulamento das CSDs segue também os princípios desenvolvidos pelas instituições abaixo indicadas, com o objetivo primordial de assegurar a solidez das infraestruturas que suportam os mercados financeiros globais.

Comité dos Sistemas de Pagamento e Liquidação (CPSS)

Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (IOSCO)

Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA):

A ESMA, enquanto organismo com competências técnicas altamente especializadas em matéria de valores mobiliários e de mercados de valores mobiliários, desempenhará um papel essencial na aplicação do Regulamento, garantindo a aplicação uniforme das regras da UE pelas autoridades nacionais competentes.
À ESMA caberá também a elaboração de projetos de normas técnicas de regulamentação e execução, do Nível 2, relacionadas com determinadas matérias.

Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM):

A CMVM é a autoridade competente, em Portugal, de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 11º do Regulamento das CSDs que autorizará e supervisionará a atividade da INTERBOLSA.

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